Boletim Doutor Agro- Setembro/Outubro
Safra de Grãos Será Menor em 2023/24, Mas Soja Deve Crescer
Vinicius Cambaúva
Beatriz Papa Casagrande
Reflexões dos fatos e números do agro em agosto/setembro e o que acompanhar em outubro
Na economia mundial e brasileira, segundo o Boletim Focus do Banco Central do Brasil divulgado em 18 de setembro, espera-se um IPCA de 4,86% (queda mensal) em 2023 e de 3,86% (também queda) em 2024. Para o indicador de crescimento econômico (PIB), é estimada uma recuperação com crescimentos de 2,89% (alta) para este ano e 1,50% (alta) para o próximo. Enquanto isso, a taxa de câmbio deve ficar em patamar próximo de 4,95 (baixa) até o final de 2023 e 5,00 (baixa) ao final de 2024. Já a Selic foi estimada em 11,75 e 9,00, respectivamente, para o ano corrente e o posterior, ambas em manutenção.
Na 5ª estimativa para a sagra global de grãos em 2023/24, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) ampliou a previsão de oferta do milho em 790 mil t, com a melhora do clima nos Estados Unidos nesta reta final de safra: estava em 1,213 bilhão de t em agosto e foi a 1,214 bilhão agora em setembro. Se confirmada, a produção será 5,1% superior à de 2022/23. A projeção americana foi a única reajustada entre os grandes produtores, de 383,83 milhões de t (agosto) para 384,42 milhões de t (setembro). China, Brasil e Argentina seguem com 277,0 (-0,07%), 129,0 (-5,8%) e 54,0 (+ 8,8%) milhões de t, respectivamente. Resultado da alta na previsão para o cereal, os estoques de milho foram também revistos para cima e estão agora estimados em 314,0 milhões de t, alta de 4,85% na comparação com o ciclo passado.
Desde a revisão pelo USDA, os preços futuros do milho em Chicago registraram queda: o contrato dez/2023 estava cotado em US$ 4,838/bushel em 14 de setembro e foi a R$ 4,707/bushel em 18 de setembro.
Na soja, o comportamento foi o contrário: revisão para baixo na estimativa de produção global, em 1,46 milhão de t, estando agora estimada em 401,33 milhões de t, ainda 8,4% superior ao ciclo passado. Se por um lado o milho americano fora beneficiado neste relatório, na soja, a previsão veio abaixo do esperado: estava em 114,25 milhões de t (agosto) e agora foi a 112,84 milhões de t (setembro). Brasil e Argentina, que ainda estão iniciando o plantio da oleaginosa, seguem com 163,0 (+ 4,5%) e 48,0 (+92,0%) milhões de t, respectivamente. Do lado dos estoques, o USDA reduziu a previsão em 160 mil t e espera 119,25 milhões de t ao final de 2023/24, alta de 15,8% no comparativo com o ciclo anterior.
Ainda sobre os preços, as negociações em Chicago também caíram para a leguminosa, mesmo com a revisão para baixo neste relatório. No contrato de nov/2023, as negociações terminaram 14 de setembro em US$ 13,610/bushel e foram a US$ 13,180/bushel na data de fechamento da nossa coluna, em 18 de setembro.
Já no algodão, uma boa notícia: após a revisão da oferta nos Estados Unidos, o Brasil deve ultrapassar os americanos e se tornar o 3º maior produtor global neste ciclo. No relatório passado, o USDA indicava a produção norte americana da pluma em 3,05 milhões de t e, neste, reduziu para 2,86 milhões de t (-9,2% em relação ao último ciclo). Como a previsão para oferta brasileira está em 3,01 milhões de t (+ 4,2%), Pode ultrapassar os americanos, se confirmado o nosso resultado no campo. Em âmbito global, a produção foi reajustada para 24,47 milhões de t (estava em 24,85) e deve fechar 2023/24 com queda de 5,3%. Os estoques, por sua vez, devem ser 3,5% inferiores, totalizando 19,6 milhões de t. Apesar da baixa, os preços da pluma na bolsa de Nova York permaneceram praticamente estáveis nos últimos dias. O contrato para dez/2023 estava em 87 cents/lb em 14 de setembro e foram a 87,80 cents/lb em 18/09.
No campo, as condições “boas” + “ótimas” das lavouras norte-americanas em 17 de setembro estavam: no milho em 51% (2022: 52%); soja em 52% (2022: 55%); e algodão em 29% (2022: 33%). O relatório também mostrou que as colheitas já foram iniciadas e, na mesma data, registram o seguinte progresso: 9,0% no milho (média das últimas 5 safras: 7,0%); 5,0% na soja (média das últimas 5: 4,0%); e 9,0% no algodão (média: 10,0%).
No Brasil, em setembro, foi divulgado o 12º e último relatório da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para a safra 2022/23 de grãos. A produção foi novamente ampliada, dessa vez para 322,75 milhões de t, alta de 18,4% em relação a temporada anterior (272,64 milhões de t). O milho obteve um aumento anual expressivo de 16,6%, um total de 131,85 milhões de t. Destes, 27,37 milhões de t são provenientes da 1ª safra (+9,4%), 102,16 milhões de t da 2ª (+18,9%) e 2,33 milhões de t da 3ª safra (+5,3%). A soja, por sua vez, continua sendo a principal cultura a impactar no volume total, com 154,62 milhões de t (+23,2%). Já a produção do algodão em pluma, foi projetada em 3,15 milhões de t (+23,3%).
A área utilizada para os grãos na safra 2022/23 foi de 78,50 milhões de ha (+5,3%). Desse total, as culturas de inverno utilizaram 4,22 milhões de ha (+11,2%), enquanto a produção foi estimada em 12,67 milhões de t (+2,1%). A média da produtividade desses cultivos caiu 8,2% em relação ao ciclo passado, ficando em 3,0 kg/ha devido aos efeitos do El Niño, caracterizado pela abundância de chuvas e aumento de temperatura na região Sul. Segundo a Companhia, a canola foi a cultura que mais retraiu em produtividade (-28,2%), seguida pelo trigo (-8,3%). No entanto, em ambos os casos a produção registrada é maior que ao ciclo passado: 103,4 mil t (+7,5%) e 10,82 milhões de t (+2,5%), respectivamente, por conta da área plantada significativamente maior.
A Conab também divulgou as perspectivas para a safra 2023/24 de grãos, que está começando. O órgão estima uma produção de 319,5 milhões de t, queda de 1,0%. A soja deve produzir 162,4 milhões de t (+ 5,1%), o milho 119,8 milhões de t (-16,1%) e o algodão em pluma 2,98 milhões de t (- 5,6%). A queda na produção total é esperada em virtude do grande resultado adquirido na safra 2022/23 (bem acima do que era esperado), bem como de prováveis impactos do clima e do El Niño na produção brasileira.
Em relação a área cultivada, ao todo, os agricultores brasileiros devem semear 78,9 milhões de ha, alta de 0,5% no comparativo com o ciclo passado. Destes, serão 45,3 milhões de ha para a soja (+2,8%), 21,2 milhões de ha no milho (-4,8%) e 1,69 para o algodão (+2,0%). A redução na área de milho advém tanto do cereal cultivado em 1ª safra (4,2 milhões de ha | – 5,4%) como no milho safrinha (16,4 milhões de ha | -4,8%).
As exportações do agronegócio brasileiro cresceram 6,6% em agosto, alcançando um novo recorde de U$ 15,63 bilhões, sendo responsáveis por 50,4% de tudo o que foi exportado pelo país. Embora os preços internacionais dos alimentos tenham registrado queda no período (-10,9%), esse cenário foi resultado do maior volume negociado (+19,7%), principalmente por conta da grande safra de grãos colhida em 22/23. O Brasil vem conquistando participação no mercado mundial.
Dentre os principais setores que contribuíram com nesses números destaca-se, em primeiro lugar, o “complexo soja”, que continua na liderança com US$ 5,59 bilhões (+12,2%) e representação de 35,7% do valor total exportado. É notável a ampliação da participação chinesa nas vendas da soja em grãos (+15,6% em relação a 2022). Diante disso, a cada 4 grãos de soja exportados pelo Brasil, 3 são enviados para o país asiático. Em segundo lugar, os “cereais, farinha e preparações” atingiram o patamar mais alto da série histórica, com US$ 2,39 bilhões ou 9,69 milhões de t comercializadas no último mês. Nesse setor, o milho se destaca participando de 90% do total, isso porque a grande safra recorde em 22/23 resultou em embarques também recordes.
O setor das “carnes” ocupou o terceiro lugar na lista, com US$ 2,06 bilhões exportados em agosto. Na carne bovina, os embarques totalizaram US$ 941,05 (-30,6%). Já a carne de frango alcançou US$ 815,65 (-9,4%), e a suína US$ 250,89 (-5,8%). Em seguida, o “complexo sucroalcooleiro” preencheu o quarto lugar com US$ 1,95 bilhões (+38,1%). Foi o único setor a apontar elevação nos preços, puxado pela alta do açúcar diante das incertezas na oferta internacional e aliado a boa safra brasileira. Por fim, a quinta posição foi dos “produtos florestais”, exportando US$ 1,10 bilhão (-21,6%) com protagonismo da celulose que representa quase metade do total.
Nas importações, o Brasil comprou US$ 1,46 bilhão em produtos do agronegócio em agosto (-13,0%). Assim, a balança comercial foi positiva em US$ 14,16 bilhões (+9,2%). De janeiro a agosto, as exportações somaram US$ 112,68 bilhões, 4,2% acima do observado no ano anterior.
Na atualização mensal do Valor Bruto da Produção (VBP) Agropecuária, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) trouxe o número de R$ 1,142 trilhão em 2023, frente ao R$ 1,135 trilhão estimado em agosto. O valor é 2,4% ou R$ 27 milhões maior em relação ao obtido em 2022 (R$ 1,115 trilhão). As lavouras devem entregar um montante financeiro de R$ 804,3 bilhões com crescimento de 4,2%, e a pecuária deve faturar R$ 338,3 bilhões, um recuo de 1,6% frente ao ano anterior. O recorde na produção de grãos, preços dos produtos e exportações são os principais aspectos que resultaram nesse cenário. Os 5 principais produtos que participam do valor total são: soja (41,0%), milho (17,7%), cana-de-açúcar (13,2%), café (6,0%) e algodão (3,8%). Além disso, diversos produtos tiveram recordes do VBP em 2023, desde o início do cálculo há mais de 30 anos, são eles: amendoim, cana-de-açúcar, feijão, laranja, mandioca, milho, tomate, entre outros.
O fenômeno climático El Niño tem 95% de chance de se estender entre janeiro e março de 2024, segundo o Centro de Previsão Climática (CPC) dos Estados Unidos. Condições mais extremas podem ser desencadeadas, como: incêndios florestais, ciclones tropicais e secas prolongadas. Os impactos se estendem globalmente, provocando maior impacto em mercados emergentes que são mais suscetíveis a flutuações nos preços de alimentos e energia. Além disso, a próxima estação de crescimento agrícola no Hemisfério Sul, incluindo áreas na África do Sul, sudeste asiático, Austrália e Brasil, pode ser afetada pelo fortalecimento do El Niño, especialmente devido ao clima mais seco e quente do que o normal.
Ainda sobre o El Niño, a alteração no regime de chuvas causado pelo fenômeno pode impactar a logística de embarques de produtos agrícolas no Canal do Panamá. Em decorrência da seca, as autoridades planejam impor restrições ao tráfego de navios durante um ano, o que afetaria as exportações dos Estados Unidos, principalmente de grãos, para o mercado asiático. O Rabobank pontua que os portos do Pacífico se tornarão alternativas essenciais, e o Brasil surge como um mercado alternativo relevante. A perda de competitividade dos portos americanos pode aumentar a demanda por grãos brasileiros, que têm estoques significativos e podem se beneficiar da janela de exportação de outubro a maio.
No primeiro semestre de 2023, 18,61 milhões de t de fertilizantes foram entregues ao mercado brasileiro, um aumento de 2,4% em relação as 18,18 milhões de t registrados no mesmo período do ano passado, segundo a Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda). Mato Grosso foi o estado líder nas entregas, representando 25,2% do total (4,69 milhões de t). Em seguida veio o Paraná (2,34 milhões), Goiás (2,09 milhões), São Paulo (1,67 milhão), Rio Grande do Sul (1,62 milhão) e Minas Gerais (1,43 milhão).
Os estoques de suco de laranja no Brasil chegaram a atingir o nível mais baixo de toda a série histórica, caindo 40,7% em relação ao ciclo anterior, totalizando 84,74 mil t, segundo a CitrusBR. Enquanto isso, a produção esperada para a temporada 2023/24 é de aproximadamente 309,34 milhões caixas de 40,8 kg, são 4,66 milhões a menos do que o registrado na safra 2022/23, de acordo com o Fundecitrus. O aumento da incidência da doença do greening no cinturão citrícola de São Paulo e Triângulo Mineiro é um dos principais fatores que afetam a produção, com um aumento significativo de 24% para mais de 38% em relação ao ano anterior. É um momento delicado para o setor, no qual a união dos produtores para o manejo correto será determinante para redução da incidência.
O agronegócio brasileiro alcançou um número recorde de empregos no segundo trimestre de 2023, com 28,3 milhões de trabalhadores, representando 26,9% de todas as ocupações do país (+0,8% em relação a 2022). O resultado foi impulsionado pelo crescimento nos agrosserviços (+7,5%) e no segmento de insumos (+6,7%), relacionado ao desempenho positivo da produção agrícola. No entanto, a agropecuária viu uma queda de 5% na força de trabalho, principalmente em categorias como “outras lavouras”, horticultura, café e cereais na agricultura, além da criação de bovinos e “outros animais” na pecuária. Esse crescimento no emprego também se refletiu na formalização e no aumento do nível de instrução dos trabalhadores no setor.
O setor agro do Brasil é referência mundial em logística reversa de embalagens de defensivos. Nos últimos 20 anos, essa prática resultou na redução de cerca de 1 milhão de toneladas de emissões de CO2, o que equivale a 18,41 mil viagens de caminhão ao redor do mundo. Em 2022, o segmento destinou corretamente 52,5 mil t de embalagens vazias, atingindo um total de 700 mil t desde 2002, de acordo com dados do Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias (inpEV).
A Forbes divulgou a lista das 10 maiores cooperativas de produção agropecuária no país, com base no resultado de 2023. Juntas, elas somam faturamento de R$ 157 bilhões. O Top 5 de faturamento é composto por: 1º) Coamo (PR) com R$ 28,1 bilhões; 2º) C.Vale (PR) com 22,7 bilhões; 3º) Lar (PR) com R$ 22,1 bilhões; 4º) Aurora (SC) com R$ 22,0 bilhões; e em 5º) a Comigo (GO) com R$ 15,7 bilhões. Parabéns a força cooperativista nacional no agro, nosso reconhecimento pelos grandes resultados.
Concluímos a conjuntura do agro com os preços dos principais produtos do setor. Na soja, considerando a entrega em cooperativa do estado de São Paulo (FOB) em meados de setembro, a cotação estava em R$ 135,80/sc (60 kg), enquanto o contrato de mar/24 era negociado a R$ 124,80/sc. No milho, o preço físico estava em R$ 54,00/sc e o futuro (B3) em R$ 57,55/sc (nov/23) e R$ 65,37/sc (mar/24). No algodão (Base Esalq), o preço era de R$ 133,57/@, uma nova baixa mensal. Outros produtos do agro, segundo o Cepea/Esalq, estavam cotados em: café arábica a R$ 825,15/sc (60 kg); o trigo Paraná em R$ 1.064,46/t; a laranja indústria (a prazo) em R$ 45,58/cx (40,8 kg) e o boi gordo em R$ 213,70/@.
Os cinco fatos do agro para acompanhar em outubro são:
- A fase inicial de plantio da safra verão de grãos 2023/24 no Brasil. Algumas áreas já iniciaram as operações, mas outubro é marcado por ser o mês em que acontece o maior avanço da semeadura. Importante olhar para o clima e os efeitos do El Niño nesse momento, o qual pode interferir tanto no avanço das operações, como no desenvolvimento inicial das culturas. É grande a preocupação com a logística de fertilizantes.
- Evolução da colheita de grãos 2023/24 nos Estados Unidos. O país norte-americano iniciou as atividades e em ritmo superior ao das últimas cinco safras. Vale acompanhar diariamente este progresso, lembrando que o clima pode ser decisivo neste final de ciclo (possibilidade de geadas e chegada da neve).
- As discussões do Marco Temporal que, caso seja derrubado, poderia ampliar a participação das terras indígenas no Brasil de 14% para 30%, um absurdo impactando de forma direta a produção agrícola nacional. O projeto que institui a demarcação já foi aprovado na Câmara e agora avança no Senado, enquanto o Supremo Tribunal Federal discute sobre a pauta. Vamos torcer para que o congresso avance nesse assunto e coloque uma pá de cal neste risco institucional.
- As novas tentativas da Ucrânia de escoar a sua produção de grãos por corredores alternativos no Mar Negro após o término do acordo com a Rússia. Alguns testes foram bem-sucedidos e outros navios começam a chegar a portos ucranianos. Vamos acompanhar os desdobramentos e se haverá alguma reação russa.
Olhar para o câmbio, que após se aproximar dos R$ 5 no início do mês, sofreu uma queda expressiva e está agora (data de fechamento da coluna) em torno de R$ 4,86. A tendência é seguir com queda, o que pode prejudicar o produtor que ainda não vendeu a safra, mas pode beneficiar aqueles que pretendem investir na 2ª safra (compra de insumos).