Fabricantes Atuando na Distribuição e Novas Estruturas de Acesso – Quais Cenários à Frente?
Matheus Alberto Cônsoli, Luciano Thomé e Castro.
Ao menos nos últimos 10 anos temos avaliado, discutido e publicado com alguma assertividade análises de cenários para o negócio de insumos, as movimentações dos fabricantes e a consolidação da distribuição. Uma série de análises podem ser encontradas no histórico de publicações aqui do Agrodistribuidor.com.br.
De fato, a consolidação da indústria já é bastante fácil de se verificar em nível global e as “tendências” de fusões, aquisições e IPOs na distribuição são evidentes e influenciam outros movimentos, seja na produção (fazendas), seja na indústria. Incrivelmente ainda há empresários céticos no setor quanto à consolidação da distribuição.
Há que se considerar que o processo não é rápido. Os processos de integração, tanto para investidores quando para empresas adquiridas não têm sido nada fáceis. Ademais, a necessidade de profissionalização, melhorias nos modelos de negócios e ganhos de eficiência são dores reais de muitos consolidadores e empresas independentes relevantes na distribuição. Entretanto, negar o fato e as perspectivas ainda por vir, parece querer “tampar o sol com a peneira”.
Do ponto de visto dos mais céticos ou conservadores, as grandes “plataformas” estão ficando lentas e perderam agilidade para empresas locais. Nesse sentido, já abordamos em matérias anteriores os esperados diferenciais competitivos dos grandes consolidadores, como escala, barganha, eficiência operacional e fontes de recursos. Comparados aos players locais, que terão vantagens de maior agilidade, relacionamento e soluções customizadas, por exemplo.
Mas a consolidação é real. Não dá para garantir que todas sairão exitosas ou que serão empresas de alta performance, mas o processo já começou a mexer com as estruturas competitivas de mercado. A mais recente foi a entrada deliberada de fabricantes e traders no negócio de distribuição. E esse é um tema realmente desafiador, estratégico, potencialmente conflituoso, mas que parece estar tomando “corpo”.
Nós mesmos, quando questionados há alguns anos sobre a “compra de revendas por fabricantes”, consideramos o cenário pouco provável. Mas nesses anos o cenário mudou e o movimento aconteceu. Uma consideração é que a consolidação mudou a relação de poder de barganha na cadeia, além de ameaçar a posição competitiva, acesso a mercado e market share de empresas de insumos e grãos. Naturalmente, os movimentos recentes mostram que os fabricantes e traders estão “incomodados” e não vão ficar parados. Agora, estes players acostumados com modelos de negócio bastante diferentes do ponto de vista de ciclo operacional, margens, estruturas de pessoal precisarão tomar muito cuidado para entender que a dinâmica é diferente e que poderão usar seu DNA nos aspectos positivos, mas ter atenção com vícios organizacionais, que podem ser danosos.
Para abordar essa questão, da mesma forma que fizemos no início do processo de consolidação ao comparar o negócio de insumos com outros setores para benchmarking, avaliamos o mesmo quanto à entrada de fabricantes na rede de acesso. Como exemplo, se retomarmos aos anos 70 nos EUA, havia uma intensa concorrência no mercado de refrigerantes tipo ‘cola’, com destacada hegemonia da Coca-Cola, e uma interação bastante conflituosa com a Pepsi, que tentava desbancar sua concorrente e ganhar share. Além de ações de marketing, canais etc a Pepsi naquela ocasião passou a comprar e investir em redes de fast food, de modo a ganhar acesso e manter exclusividade (dado que Coca-Cola estava já alinhada em contratos exclusivos com o McDonald’s). Vejam por exemplo a reação de players globais de varejo como Wal-Mart tentando potencializar seu modelo digital, para enfrentar a hegemonia da Amazon.
Esses exemplos ilustram como a tentativa de manter ou ganhar market share, defender sua posição e se aproximar dos clientes pode levar empresas tradicionalmente de um elo da cadeia a avançar para outros (seja para frente ou para traz), ou a transformar seu negócio ampliando a opções de canais. No caso das empresas de insumos, traders e correlatos, isso parece começar a ganhar tração. Um fator impulsionador é a questão do poder de barganha já citado, além da redução do modelo de exclusividade/bandeirização, dificuldade de gerar demanda, entrada de novos players, necessidade de acelerar estratégias digitais, entre outros.
Assim, nossa visão de cenário atualizado começa a mudar, mantendo a onda de consolidação, novas fusões, aquisições, joint-ventures e IPOs na distribuição. Mas não deve parar por ai! Indústrias e outras empresas podem ainda expandir e criar redes próprias, desenvolver redes patrocinadas, adquirir canais existentes, lançar franquias e outros modelos de acesso. Ademais, modelos de vendas digitais – com ou sem integração com marketplaces ou revendas –, vendas diretas e programas de incentivos diretos ao agricultor deve se tornar mais presentes e intensificar ainda mais o jogo de acesso ao mercado. O caso do varejo de insumos americano é sempre um bom exemplo para entender os extremos. Neste mercado onde 6 empresas juntas já fazem cerca 60% dos negócios, entre 20-25% ficam com empresas independentes regionais que batalham pela fidelidade dos produtores com modelos de altos serviços e proximidade, além da presença de cooperativas também regionais com o restante do mercado. Ou seja, existe espaço para todo mundo, do grande ao pequeno, mas vejam que quem quer ser relevante precisa assumir um posicionamento diferenciado.
Ganha a concorrência, ganha o produtor com mais opções e alternativas. Mas o fato é que agentes atuais da cadeia deverão continuar a busca por inovações, serviços, agilidade de atendimento e diferenciais, pois o futuro parece ser de estruturas de acesso amplas, complementares e sobrepostas, trazendo oportunidades e desafios que ainda não estamos acostumados a lidar. Que tenham um bom trabalho e ótimas inspirações para o futuro dos seus negócios!